Sob a luz de Obina e Brocador, Rodinei junta folclore e redenção no Flamengo
Rodinei comemorando gol do título da Copa do Brasil pelo Flamengo – Foto: Marcelo Cortes
TRIVELA: Por Leandro Stein
O futebol por vezes oferece momentos em que é tão óbvio adivinhar o que vai acontecer que parece escrito por um roteirista de pouca imaginação. Quando Rodinei partiu para a marca da cal no Maracanã abarrotado, com a chance de decidir a final da Copa do Brasil, sua redenção já soava como traçada. Logicamente, muitos rubro-negros temeram pelo pior, depois de xingarem o lateral por tantas vezes ao longo de anos. Para os flamenguistas mais apegados à história do clube, porém, um flash veio à cabeça: “se em 2006 Obina virou melhor que Eto’o e em 2013 Hernane brocou, por que não Rodilindo?”. A mística estava lá, com um quê de folclore que também faz parte da identidade do Fla em grandes feitos, em especial na Copa do Brasil. Rodinei era um poço de confiança. Não se intimidou com Cássio, encheu o pé, estufou as redes. Viveu seu ápice, num momento tão Flamengo dentro do Maraca em festa.
A própria Copa do Brasil é um torneio singular na história do Flamengo. Basta lembrar como aconteceram os outros três títulos, os seus contextos. A conquista do torneio, mais do que a euforia, marca momentos em que se recuperou o brio. O primeiro troféu em 1990 permitiu que os rubro-negros seguissem em frente numa difícil primeira temporada sem Zico, num time cheio de pratas da casa. A reconquista em 2006 seria ainda mais notável, em tempos de seca nacional e frustrações corriqueiras, numa final cheia de rivalidade contra o Vasco. Já em 2013 a taça surgia como uma faísca em tempos de reestruturação e retomada do Maracanã, com a torcida embalando uma equipe que pegava no tranco.
Se o período recente de conquistas frequentes do Flamengo não faz a Copa do Brasil de 2022 adentrar no mesmo drama de tempos idos, há outros elementos que valorizam a campanha. Existe uma recuperação dentro da própria temporada que não vinha nada bem, inclusive com um momento em que os rubro-negros flertaram seriamente com a eliminação, diante do Atlético Mineiro. Além disso, com nove anos de jejum, a Copa do Brasil não era o terreno mais fértil para o Fla – pelo contrário, algumas das quedas recentes foram bastante amargas. E, para amarrar tudo isso, Rodinei perseguiu a principal redenção.
Explicar a relação de Rodinei com o Flamengo não é algo simples. Lá se vão seis anos desde a chegada do lateral ao clube, com um hiato apenas durante o empréstimo ao Internacional. O camisa 22 foi um ponto constante de críticas e desconfiança, presente em momentos ruins, mas também coadjuvante em conquistas e com boas fases pontuais. Além da bola, a maneira como se faz querido dentro dos vestiários é perceptível e sempre foi uma das figuras mais simpáticas diante das câmeras. Por mais que o carisma sozinho não baste, ele por vezes dá sua ajuda. Já a volta recente do lateral à Gávea, quando ninguém conseguia ocupar o lado direito da defesa, expressa bem o turbilhão de emoções envolto ao redor de Rodinei – e dos rubro-negros.
Algumas das melhores atuações do Flamengo em 2022 tiveram Rodinei como destaque. A explosão do lateral pela direita se tornou um escape constante do time e por ali os rubro-negros amassaram adversários. A galera mais empolgada, inclusive alguns com microfone nas mãos, chegaram a pedi-lo, vejam só, na Seleção. Mas não que o camisa 22 permaneça incólume. Gols sofridos e tropeços foram colocados na sua conta pelas deficiências defensivas que tem. Também houve adversários que investiram em seu jogo por ali, no flanco direito. Era a dor e a delícia de se ter Rodinei no time, que o flamenguista conhece tão bem – mesmo que “a delícia” estivesse vindo numa quantidade maior que a usual.
Rodinei seria personagem inescapável na final da Copa do Brasil. Teve os momentos em que se mandou para o ataque, teve seus problemas na marcação. Não influenciou diretamente no gol do Flamengo. E, se deu sorte quando Roger Guedes perdeu aquela chance embaixo da trave, só assistiu ao empate do Corinthians. Nada de novo sob o sol. Uma conquista que antes parecia nas mãos dos rubro-negros ficava prestes a escapar. As palpitações foram constantes, até que o apito final decretasse o empate e a disputa por pênaltis.
As decisões da Copa do Brasil, por outro lado, não marcam apenas períodos de redenção ao Flamengo. Há pancadas muito dolorosas na história também, todas elas pululando na memória durante os minutos mais dramáticos desta quarta. Havia quem agradecesse o fim do gol qualificado, que puniu os rubro-negros com o vice diante do Grêmio em 1997. O empate em casa, diferentemente de 2003, não teve letra do Alex para desmoralizar. Um revés contra os corintianos também não abriria um rombo no Maraca como fez o Santo André em 2004. Os pênaltis, iminentes, ao menos veriam um goleiro melhor que Alex Muralha em 2017. Pensamentos vem e vão, na tentativa de se agarrar a uma crendice que diga, nas entrelinhas, que o time será campeão.
E a visão turva do torcedor mais alucinado só clareou quando Rodinei partiu para o último pênalti do Flamengo, nas alternadas, para decretar a reconquista da Copa do Brasil nove anos depois. Estava com uma aura de Obina, que se tornou um xodó definitivo pela maneira como arrebentou contra o Vasco em 2006. Tinha um ar de Hernane Brocador, imparável naquela campanha de 2013 para dar embalo ao time de Jayme de Almeida. Rodinei estava a 11 metros de redefinir a sua própria história, por mais que um gigante como Cássio se colocasse no caminho. Bola nas redes, a gratidão de quem ama odiá-lo e de quem odeia amá-lo era mesmo para Rodilindo.
O Flamengo tem vários personagens memoráveis que não precisam ser colocados em busto na sede do clube. Tinham suas limitações, se doavam ao máximo, enchiam o peito junto com o canto da massa para se superarem e se consagrarem. E se a zoeira tantas vezes é o combustível da torcida rubro-negra, da empolgação exagerada à alegria mais debochada, Rodinei talvez fosse mesmo fadado a ter seu capítulo dourado. Precisou em seis anos fazer muitos torcedores arrancarem os cabelos, mas não esteve à toa por tanto tempo ali. Seu folclore culminaria também na glória, num clube em que os dois elementos podem sim se misturar. Seu lugar ao lado de Obina e Brocador estará garantido em qualquer página que recontar o que é a Copa do Brasil ao Flamengo.
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