Com valorização da Copa do Brasil, dirigentes passaram a ter incentivo ao risco

Time do Flamengo na Copa do Brasil 2022 – Foto: Marcelo Cortes

O GLOBO: Por Rodrigo Capelo

De uns anos para cá, foi colocado na Copa do Brasil o rótulo da riqueza. Se seu time passa de fase, garante tantos milhões de reais em premiação. Se for campeão, uma bolada. E, se for eliminado antes do esperado, o repórter logo avisa que o orçamento não será cumprido. Talvez tenhamos perdido a linha, porque a atenção ao dinheiro às vezes parece se sobrepor à partida, mas esta é outra história. Curioso é notar como este torneio mudou o nosso futebol.

Corinthians e Flamengo disputam, além do título, é verdade, premiações muito altas. O campeão sairá da competição com R$ 77 milhões, enquanto o vice, com R$ 42 milhões. Sem muito rigor com os números, vamos combinar que essas quantias equivalem a algo entre 6% e 8% do faturamento desses clubes na temporada. Quando o Barcelona ganha a Copa del Rey, na Espanha, embolsa 600 mil euros. Menos de 0,1% da arrecadação anual do catalão.

Por que a Copa do Brasil paga tanto a mais do que a espanhola? Porque ela proporciona muito mais dinheiro com a venda dos direitos de transmissão, cuja venda está sob responsabilidade da CBF. É possível que o brasileiro tenha se apegado a esta competição por causa de seu formato, o mata-mata, eliminado do Campeonato Brasileiro desde a adoção dos pontos corridos em 2003. Algo a ser checado por estudiosos de ramos além do meramente financeiro.

Além de gerar mais dinheiro, a distribuição é diferente. A Copa del Rey reparte de acordo com as regras do decreto real que regulou os direitos de transmissão na Espanha: 90% para a primeira divisão, e divisão em 50-25-25 na parte que compete à elite. A Copa do Brasil não faz assim. Ela é totalmente meritocrática — com cotas pré-definidas para cada fase —, e digamos que é também agressiva, pois o campeão fica com muitíssimo mais do que os outros.

Este esquema afeta os clubes de maneira diferente. O Flamengo, que já fatura muito mais, se valerá das finais de Copa do Brasil e Libertadores para arrecadar, manter o nível atual de competitividade e acirrar a desigualdade perante rivais. Corinthians e São Paulo cometeram seus exageros, em busca das premiações, enquanto lidam com crises financeiras severas. Outros nem sequer chegaram às finais e ficarão para trás, de um jeito inédito até então.

Quando somamos direitos de transmissão e premiações de todas as competições, temos o seguinte quadro. Em 2010, 92% dos valores eram repartidos pelos clubes de maneira fixa e pré-definida. A política via Clube dos 13 ditava quem teria acesso ao dinheiro. Dirigentes mudaram a fórmula de divisão do Brasileiro, mas não prestaram atenção à mudança que a Copa do Brasil impunha. Em 2019, 70% eram fixos e 30%, variáveis, mediante performance.

As regras do jogo estimulam comportamentos de seus participantes. Como a Copa do Brasil se valorizou muito nos últimos anos, e a sua distribuição privilegia quem chega à final, dirigentes passaram a ter um incentivo ao risco. Não é só mais uma questão de conquistar um título nacional, marcar o nome na história, mas de arrecadar muito mais e, talvez, compensar gastos.

Este fenômeno se percebe no exterior quando se trata da Liga dos Campeões, porém não na Copa del Rey, nem de qualquer competição semelhante entre outros países. Algo que diferencia o nosso mercado. Mais um motivo para a implementação de um sistema de fair play financeiro, pois irresponsabilidades precisam ser contidas. E que vença quem gerir melhor.

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